por vazosdopurus
O juiz eleitoral do Município de Silves, a 200km em
linha reta de Manaus, Dr. Onildo Santana de Brito, negou o recurso inominado
impetrado pelos advogados do Prefeito cassado Franrossi de Oliveira Lira (o
Bojó), do PSD, e do Vice-prefeito cassado Jasmire dos Santos Machado, do PT.
Ambos continuam fora da Prefeitura, que está sendo governada por Nelci de
Oliveira Lira ( o Neco), Presidente da Câmara de Silves, até nova eleição que
deve ser marcada em breve, no Município.
Veja a decisão do Juiz, sobre o recurso, publicada
hoje:
039ª Zona Eleitoral
Ato Judicial
AIJE n°: 282-81.2012.6.04.0039
Investigante: Aristides Queiroz de Oliveira Neto
Advogado: Dr. Cristian Mendes da Silva – OAB/AM
A-691
Investigado: Franrossi de Oliveira Lira
Advogado: Dra. Maria Auxiliadora dos Santos Benigno
– OAB/AM A-619
Investigado: Jasmire dos Santos Machado
Advogado: Dr. Kennedy Monteiro de Oliveira – OAB/AM
7.389
DECISÃO
Trata-se de Recurso Inominado em face de sentença
de fls. 394/438.
DECIDO.
Compulsando os autos verifico que os recorrentes
não têm razão em seu apelo, assim em sede de juízo de retração mantenho a
sentença recorrida pelos seus próprios fundamentos.
E faço reiterando cada razão de decidir exposta na
sentença a par de ainda considerar o seguinte:
Como já afirmado na sentença a presente AIJE cuida
da proteção de direitos difusos e indisponíveis, assim ela não se presta a
defender interesses privados de alguém. Considerando isso, já é possível
concluir que ao Representante desta AIJE não é permitido limitar os efeitos
jurídicos da procedência da mesma.
As consequências jurídicas que decorrem do
acolhimento judicial da imputação de prática de abuso de poder político são
fixadas por lei absolutamente cogente: nulidade da votação, cassação do
registro ou do diploma, bem como a aplicação de pena de inelegibilidade ao
agente do ato ilícito e aos beneficiários destes (CE, art. 222 e LC nº 64/90,
arts. 1º, I, d e h, e 22, XIV).
Assim a omissão do Representante que venha a não
incluir no “pedido” alguma dessas “consequências jurídicas que decorrem da
condenação pela prática do abuso do poder estatal” não impedirá que o Juiz
imponha-a ao agente público e ao terceiro beneficiário da conduta por
decorrência da procedência da AIJE.
Aqui a regra é da aplicação cogente da lei no
sentido de que sempre que subsumido dentro do devido processo legal que o
comportamento do agente estatal configura prática de abuso de poder político,
deve ser aplicada a pena de inelegibilidade, bem como cassado o diploma daquele
beneficiário da conduta abusiva.
E os Recorrentes compreenderam parcialmente bem a
sentença quando no “item 23″ de seu recurso dizem que “… o que sobressai da
decisão é que o Juízo a quo acolheu como verdadeiro o fato narrado na exordial
de que servidores públicos valeram-se de sua condição para beneficiar os
Recorrentes, utilizando tão somente esse fundamento para considerar
procedente a AIJE e aplicar a pena máxima de cassação e, ainda, de
inelegibilidade por 8 anos!” (fls. 454, mas acrescentei grifos).
Compreenderam os Recorrentes por que razão tiveram
os diplomados cassados, bem como porque aplicado as penas de inelegibilidades.
Mas não se pode concordar com sua compreensão em pretender adjetivar a “prática
de abuso de poder político – por parte de agente públicos da Justiça Eleitoral
local – da qual são eles beneficiados” como ato de menor importância moral e
jurídica.
O abuso de poder político praticado não é “tão
somente de menor importância”, mas sim de “máxima gravidade porque lesivo ao
Estado democrático de direito, merecendo repressão exemplar”.
E a sentença proferida segue o prumo da coerência,
vez que, considerando o quanto provado nos autos, restou claro que as condutas
praticadas pelos agentes públicos lotados no Cartório Eleitoral de Silves não
se subsumem a prática de alguma conduta prevista nos arts. 73 a 77 da Lei das
Eleições. Mas sim configuraram abuso de poder político que disciplinado no art.
1º, h, da LC nº 64/90. E, por consequência, os
comportamentos dos beneficiários dos atos abusivos são de serem enquadrados na
alínea d, do art. 1º, da LC nº 64/90.
Assim, é que a AIJE por abuso de poder político,
que disciplinada nos arts. 1º, d e h, 19 e 22 da LC nº 64/90, se baseia em
conceito de abuso de poder genérico e que aprioristicamente indeterminado.
Assim, aludida ação apresenta-se como um instrumento processual
de reserva porquanto se presta para o combate de inúmeras e infindáveis
formas de condutas eleitorais abusivas graves, cuja caracterização concreta e
fática é delineada pela criatividade negativa humana.
Ao revés, a AIJE por conduta vedada a agentes
públicos tem por fundamentos “tipos de conteúdo mais preciso e determinado”, na
forma delineada nos diversos incisos do art. 73, da LE. Apresenta-se ela,
portanto, como ação repressiva específica para aludidas hipóteses de
modalidades de abuso de poder.
Para esclarecimento anoto, ao lado do magistério de
José Jairo Gomes, que aludida interpretação sistema da legislação eleitoral tem
amparo na jurisprudência do egrégio TSE. Para exemplificar colaciono a ementa
do Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 300-06.2012, da relatoria
do Min. Dias Toffoli:
ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL.
NEGATIVA DE SEGUIMENTO. DEFERIMENTO. REGISTRO DE CANDIDATO. PREFEITO.
CONDENAÇÃO. CONDUTA VEDADA. IMPOSIÇÃO. MULTA. AUSÊNCIA. CASSAÇÃO.
INAPLICABILIDADE DAS ALÍNEAS ALÍENAS H e J DO
INCISO I DO ART. 1º DA LC Nº 64/90.
1.
A condenação por conduta vedada não atrai a
inelegibilidade da alínea h do inciso I do art. 1º da LC nº 64/90, que
pressupõe condenação por abuso do poder econômico ou político.
2.
2. Para a incidência da inelegibilidade da alínea j
do inciso I do art. 1º da LC nº 64/90, é necessário que a condenação por
conduta vedada tenha implicado a cassação do registro ou do diploma.
Precedente.
3. Tendo sido afastada a pena de cassação e imposta
tão somente a pena de multa, em razão do princípio da proporcionalidade,
levando-se em conta a menor gravidade da conduta vedada, perde relevo a
alegação de que o candidato somente não foi cassado em sede de recurso
especial, por não ter sido eleito.
4. [...]
5. Agravo regimental desprovido.
Para não deixar dúvidas transcrevo parte do voto do
Min. Dias Toffoli, proferido em aludido julgado:
A agravante pretende que a condenação do ora
agravado em sede de representação por conduta vedada, na qual lhe fora aplicada
pena de multa, seja enquadrada na inelegibilidade das alíneas h e j do inciso I
do art. 1° da LC n° 64/90.
Para tanto, sustenta a tese de que o disposto na
alínea h não exige que a condenação seja por abuso de poder, sendo suficiente o
benefício advindo da conduta ilícita, que pode ser tanto captação ilícita de
sufrágio, gastos irregulares de campanha, conduta vedada ou abuso de poder. No
entanto, caso fosse procedente o argumento, não seria necessário haver os
demais dispositivos indicando especificamente a conduta geradora da
inelegibilidade, a exemplo da alínea h, que trata da condenação por abuso de
poder, e da j, que impõe inelegibilidade àqueles condenados por corrupção
eleitoral, conduta vedada, captação ilicita de sufrágio, doação ou captação irregular
de recursos de campanha e conduta vedada. (acrescentei grifos)
Transcrevo, a propósito, a redação da mencionada
alínea n.
Art. 1º São inelegíveis:
- para qualquer cargo:
[...]
h) os detentores de cargo na administração pública
direta, indireta ou fundacional, que beneficiarem a si ou a terceiros, pelo
abuso do poder econômico ou político, que forem condenados em decisão
transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, para a eleição
na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem
nos 8 (oito) anos seguintes.
A inelegibilidade da mencionada alínea h, ao
contrário do que alega a ora agravante, pressupõe condenação por abuso do poder
econômico ou político daqueles que tenham se beneficiado da prática abusiva ou
tenham beneficiado a terceiros.
O requisito, portanto, é a condenação por abuso de
poder econômico ou político, e não por qualquer outra conduta.
No caso em exame, como bem pontuado pela Corte
Regional, não houve condenação por abuso, mas sim por conduta vedada, cuja
hipótese seria enquadrável na inelegibilidade prevista na alínea j do mesmo
dispositivo legal, que assim reza:
j) os que forem condenados, em decisão transitada
em julgado ou proferida por órgão colegiado da Justiça Eleitoral, por corrupção
eleitoral, por captação ilícita de sufrágio, por doação, captação ou gastos
ilícitos de recursos de campanha ou por conduta vedada aos agentes públicos em
campanhas eleitorais que impliquem cassação do registro ou do diploma, pelo
prazo de 8 (oito) anos a contar da eleição.
E nessas circunstâncias, não ocorre a incoerência
invocada pelos Recorrentes, porque a AIJE por abuso do poder político não
exige a formação de litisconsórcio necessário entre o agente público e o
candidato beneficiado. Nesse sentido e para justificar já colacionei no
corpo da sentença a jurisprudência do egrégio TSE que veiculada no Recurso
Ordinário nº 1526. Olhe ainda a reafirmação de aludida jurisprudência no
Recurso Especial Eleitoral n° 35.980, cuja ementa agora colaciono:
RECURSO ESPECIAL. INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL.
ABUSO DO PODER POLÍTICO. COAÇÃO. ELEITOR. EXCLUSÃO. PROGRAMA. CARÁTER SOCIAL.
IMPOSSIBILIDADE. REEXAME. MATÉRIA DE FATO. MATÉRIA DE PROVA.
1.
O art. 22 da LC nº 64/90 não exige a formação de
litisconsórcio passivo necessário entre o representado e aqueles que
contribuíram para o abuso. Precedentes.
2.
2. Consignando-se, no acórdão regional, que as
testemunhas não foram sequer contraditadas, não há como acolher a alegada falta
de credibilidade de seus depoimentos.
3. A decretação de inelegibilidade constitui sanção
prevista no art. 22, XIV, da LC nº 64/90, sendo perfeitamente cabível quando a
causa de pedir reside na prática de abuso do poder político, não ficando
caracterizado, in casu, o julgamento extra petita.
4. Inviável, em sede de recurso especial,
proceder-se a reexame da prova para avaliar a força de convicção que possam ter
os elementos colhidos acerca da caracterização do abuso do poder político e da
potencialidade das condutas abusivas para afetar o equilíbrio do pleito
(Súmulas nº 7/STJ e 279/STF).
5. Recurso especial desprovido.
E quanto ao argumento de que os agentes públicos
que praticaram o abuso do poder políticos não tiveram oportunidade de defesa,
digo que isso ocorreu porque não poderia ser juridicamente diferente, vez que
nenhum deles é parte nesta AIJE – embora cada um pudesse sê-lo na condição de
litisconsorte passivo facultativo.
E não há nenhuma violação ao devido processo legal,
porque a sentença não atinge a esfera jurídica de algum desses agentes
públicos, sendo que, em relação a eles, os fatos foram apurados nos autos e, ao
final da cognição exauriente, firmados verdadeiros em razão de imperiosas
necessidades de motivação e de fundamentação da sentença proferia nesta AIJE
que apurou a responsabilidade jurídica somente dos candidatos e ora
Representados (CPC, arts. 469 e 472).
Assim, não se fez uso de alguma técnica processual
esdrúxula nos autos, inclusive na maioria das ações em que se busca apurar a
responsabilidade civil objetiva do Estado, o servidor causador do dano à vítima
não figura como parte nos autos, embora seja necessário para efeito de
fundamentação e para a viabilidade do próprio julgamento apurar sua conduta
danosa – particularmente quanto à existência de nexo de causalidade entre a
conduta do agente e o dano sofrido pela vítima.
Nesse sentido colaciono a ementa do julgado do
egrégio STJ, referente ao Recurso Especial nº 91.202:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ACIDENTE DE
TRÂNSITO. INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DENUNCIAÇÃO À LIDE DO
AGENTE CAUSADOR DO DANO. NÃO-OBRIGATORIEDADE. AÇÃO REGRESSIVA.
1.
Esta Corte perfilhou entendimento de que não é
obrigatória a denunciação à lide do agente, nas ações de indenização baseadas
na responsabilidade civil objetiva do Estado, mesmo em casos de acidente de
trânsito.
2.
2. Recurso especial improvido.
Também no processo penal é possível, por vezes até
obrigatório, a separação de processos nos quais se fará a apuração de um mesmo
fato criminoso que praticado por duas ou mais pessoas (CPP, arts. 79 e 80). Em
caso assim é necessário que o juiz, de regra, afirme que terceiro (o qual
possível réu em outro processo) contribuiu para a execução do crime imputado ao
réu – por exemplo: o terceiro segurou a vítima, enquanto o réu desferiu uma
facada na mesma. Nesse caso a “terceira pessoa” não estaria sendo julgada, mas
apenas o “réu”.
Assim, no caso em julgamento nesta AIJE como os
Recorrentes figuram como beneficiários de condutas ilícitas práticas por
terceiros – que agentes públicos – foi necessário previamente firmar as
existências das condutas praticadas por estes. E o processo segue a mesma
lógica com ou sem a participação de aludidos agentes públicos: busca-se provar
os fatos narrados na petição inicial – causa de pedir – com testemunhos,
documentos e demais provas admitidas no direito.
E ao contrário do que alegam os Recorrentes tudo
restou comprovados nos autos por um conjunto probatório coerente e consistente,
vez que interligando diversos fatos provados nos autos, os quais só
aparentemente desconexos, foi possível concluir que os candidatos ora
Representados são beneficiários de abuso de poder políticos nas eleições
municipais de Silves de 2012.
E a instrução processual desta AIJE não se resume
somente aos depoimentos de testemunhas arroladas pelo Representante, os quais
colhidos em contraditório em audiência de instrução e julgamento. Basta
verificar que para fundamentar a sentença também foram utilizadas a prova
documental contida nos autos e as declarações prestadas por pessoas
relacionadas aos fatos (que embora colhidos em outros procedimentos foram
submetidos ao contraditório nestes autos).
Nesse ponto é preciso deixar claro que a sentença
não é teratológica, porque a mesma não contém contradição nem se fundamenta em
provas frágeis. E não é o caso de atender o máximo rigor silogístico, porque é
preciso admitir que a soma de um encadeamento de fatos é capaz de revelar a
verdade. E como disse, a existência do abuso de poder político que se
prestou em benefícios dos candidatos ora Representados foi comprovada nos autos
por um conjunto de fatos particulares que direcionam com segurança para aludida
conclusão.
Quanto à alegação de defeitos processuais do
recurso, por conta de que não foi apresentada a petição original do mesmo no
prazo legal, considero prudente encaminhar os presentes autos ao egrégio
TRE/AM, ao qual cabe exercer originariamente o juízo de admissibilidade de
aludido recurso, inclusive quanto à tempestividade ou não dele.
Pelo exposto, admito o
processamento do recurso inominado eleitoral dos Representados, bem como, em
sede de juízo de retratação, mantenho integralmente a sentença recorrida.
Intimem-se. Após, ao Cartório para a remessa destes
autos ao egrégio TRE/AM, com as cautelas de praxe.
Em, 21 de junho de 2013.
ONILDO SANTANA DE BRITO
Juiz da 39ª Zona Eleitoral
Fonte: Blogdosidoca
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