Angustiados com a demora do trabalho de buscas,
parentes de dois dos três desaparecidos na reserva indígena Tenharim dizem que
investigações andam a passos de tartaruga e que governo federal está sendo
omisso com o drama das famílias
BRUNA SOUZA
Força tarefa em reunião com familiares dos desaparecidos (Clóvis Miranda) |
"Com as matérias que têm saído na imprensa, vi
que a vida do índio é mais importante que a do branco. Nessa situação de
Humaitá, onde meu marido e mais dois pais de famílias estão desaparecidos e até
agora não temos nenhuma informação, parece que há um descaso. O que esperamos é
que eles não passem a mão nos culpados, independente de sua raça, afinal nós
também somos brasileiros.
Até agora não sabemos nada, meu coração está com
ódio da presidente Dilma, por passar a mão na cabeça desses infelizes",
disse com lágrimas nos olhos a dona de casa Adriana dos Santos, esposa do
representante comercial Luciano Ferreira Freire, 30.
A declaração foi dada na manhã desta quarta-feira
(8) durante uma conversa com familiares de Luciano no município de Humaitá
(localizado a 590 quilômetros em linha reta de Manaus). Os familiaresacreditam
que a falta de informações do caso pode ser baseada no posicionamento da
presidente Dilma Rousseff que apóia as causas indígenas e do ministro da
Justiça, José Eduardo Cardoso, que garantiu que quem cometesse “abusos” contra
índios deveria ser “punido”.
Além do marido de Adriana estão desaparecidos o
professor Steff Pinheiro de Souza e o funcionário da Eletrobrás Amazonas
Energia Aldeney Ribeiro Salvador. Eles trafegavam em um carro modelo Gol, de
cor preta, e foram vistos pela última vez nas proximidades do quilômetro
130 da Transamazônica (BR-230), que fica dentro da reserva indígena Tenharim
Marmelos, entre os municípios de Humaitá e Manicoré. Moradores acusam os índios
de terem sequestrado os homens em represália à morte do cacique Ivan Tenharim.
“Dá impressão que isso vai ficar isso mesmo.
Questionei o general Villas Bôas, do Exército, que se fossem os brancos que
tivessem feito alguma coisa com os índios, já teriam prendido metade da
população para dar resposta ao país com um caso elucidado. Como não é o caso,
está parecendo que estão tentando se calar”, disse um dos familiares das
vítimas, que preferiu não se identificar.
Declarações polêmicas
As declarações da presidente e do ministro causaram
um sentimento de revolta na população do município, que acredita os índios
possam acabar sendo beneficiados. Segundo o funcionário público Raimundo Nonato
Cardoso, 48, que é tio de Adriana, já são 23 dias de angústia, sem saber
notícias sobre o paradeiro dos homens e convivendo em meio a boatos. Eles
questionam a falta de informações pela Polícia Federal de Rondônia (RO), que
está à frente do caso.
“As investigações estão andando, mas a passos de tartaruga.
Por se tratar de uma terra indígena, a polícia demorou muito a ser acionada e
principalmente, a começar a desvendar os fatos. Se os indígenas mataram o
Luciano, o Aldeney e o professor Steff, eles tiveram tempo de apagar indícios
importantes. Infelizmente não esperamos mais eles voltarem para casa, achamos
que eles não estão mais vivos. Domingo vieram entregar o remédio do filho da
minha sobrinha que estava com Luciano e foi encontrado junto com os destroços
de um veículo. Queremos apenas dar um enterro digno ao nosso ente querido e ver
a justiça sendo feita, independente se foi um índio ou não que cometeu o
crime”, desabafou Cardoso.
PF está reticente
Raimundo acredita na competência da Polícia Federal
e que já há informações contundentes sobre o caso. “Mas como se trata de fato
que pode gerar um conflito nacional envolvendo indígenas e brancos, nada tem
sido divulgado para não atrapalhar o governo federal, no ano em que os olhares
do mundo estão voltados para o Brasil”, disse.
Após o boato do encontro dos corpos dos
desaparecidos na última semana, a força de segurança - que está à frente da
investigação e das buscas – passou a limitar as informações sobre o caso,
inclusive, com a diminuição de notas oficiais para os veículos de comunicação
que acompanham o trabalho.
Vídeo para presidente Dilma
O deputado federal Silas Câmara (PSD), que está em
uma viagem pelos municípios do Rio Madeira, visitou os familiares dos três
desaparecidos e relatou a equipe de reportagem do Portal acritica.com, que
pretende falar com a presidente Dilma, o ministro da justiça José Eduardo
Cardoso e a ministra de Direitos Humanos Maria do Rosário sobre o conflito
envolvendo brancos e indígenas na região.
“Tive a oportunidade de ouvir os familiares e
fiquei muito sensibilizado com a situação vivida pelo município com esse caso.
Ouvimos muitas histórias, inclusive de outros desaparecimentos gerados por esse
conflito. Assim que retornar a Brasília, me comprometi de entregar um vídeo
para a presidente e os ministros, mostrando o sofrimento da família e pedirei
que mudanças sejam feitas. Vou procurar também as comissões de direitos, da
Amazônia e segurança pública. Nos últimos anos, ocorreram fatos em que índios
mataram brancos e os crimes ficaram sem solução. O melhor método para que isso
mude é a alteração do Código Penal Brasileiro. Minha luta vai ser para que a
justiça seja legal para todos. Lei boa é igualitária, seja índio, branco ou
negro, evangélico ou católico, sem distinção”, disse o parlamentar.
Investigação
Policiais federais e militares do exército
continuam as buscas na reserva Tenharim, principalmente na região do Igarapé
Preto, onde foram encontrados partes do carro queimado. Os objetos encontrados
na tarde da última sexta-feira (3) foram encaminhados para perícia e a polícia
aguarda os resultados do laudo que deve sair nos próximos dias.
Fonte: acritica.uol.com.br
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